Diretamente do Morro dos Prazeres, Igor Amaro, produtor cultural de 35 anos, quer fazer história conectando a favela à web 3.0. Entusiasta das novas tecnologias, Igor começou a sua trajetória como um agitador por volta de 2012, quando organizou o primeiro Baile Black Santa, um movimento de cultura hip-hop que buscava a valorização dos moradores da comunidade a partir da identificação com a música, dança e cultura.
Em meio a um cenário em que as favelas eram ocupadas pelas Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), a nova onda de intervenções tomou conta do Morro dos Prazeres, que como define o próprio Igor, é “um morro em cima do morro da Santa Tereza”. As festas organizadas por ele começaram com algumas dezenas de pessoas, até o dia em que conseguiu contratar MV Bill para se apresentar para quase 5 mil pessoas.
Apesar do envolvimento, Igor nunca conseguiu ter a estabilidade financeira por sua vida profissional e todo aquela bagagem não foi suficiente para garantir noites tranquilas. Quando chegou a pandemia de Covid-19, o produtor se viu em uma situação desesperadora.
Desempregado, usou parte do auxílio-emergencial para poder investir e fazer aquela grana “multiplicar”. Ainda sem tanto conhecimento, apostou em uma moeda digital que valorizou cerca de 1000% e deu a ele uma renda em pouco tempo. Foi o pontapé inicial que precisava para mergulhar de cabeça no universo cripto.
“Peguei parte do auxílio, investi uma moedinha e me deu 1000% de retorno, aquele ‘boom’. Aí eu passo 2021 todo estudando criptografia, 24 horas por dia, começo a me identificar e ver surgir o NFT. Pensei, pô, posso fazer alguma coisa com isso”, relembrou.

Foi entendendo mais sobre NFT, que Igor teve a ideia que mudou a sua vida, unindo a sua vontade de transformar a sua comunidade com a possibilidade de também mudar para sempre a sua realidade financeira.
O Favelaverso nasce primeiro com a ideia de assegurar a cada morador do Morro dos Prazeres a escritura de sua casa em NFT. Este foi o mote que mobilizou Igor a fundar o projeto, considerando que quase todos os que moram nas favelas nunca tiveram nenhum registro dos seus imóveis.
“Eu queria fazer uma coleção que desse aos moradores de favela os registros da sua casa em NFT. Dignidade né, cara? O direito que todo cidadão deveria ter. O estado tem uma visão sobre as favelas que é muito controladora. Já que ele não faz nada, não traz tecnologia, não investe em saneamento básico, só coloca operação policial, devia permitir que cada morador tenha o direito de registrar a sua casa”, reflete.
Mas, ao perceber que o dia a dia na comunidade ainda não comportava o tamanho do seu sonho, Igor viu que primeiro era preciso investir na educação. Passou a procurar formas de investir em seu projeto, buscando entrar na cena e conhecer outras pessoas que já estavam à vontade na web 3.0
Quando soube do evento NFT Rio, que aconteceu em setembro, Igor não pensou duas vezes. Pediu carona a um amigo italiano “mais carioca que muita gente”, chamado Alberto, que o levou de moto até o Jardim Botânico. Sem ingresso, acessou somente a exposição aberta ao público. Ele tirou uma foto para o perfil do Favelaverso e compartilhou marcando o NFT Rio. Foi o suficiente para que alavancasse as suas redes sociais e despertasse o interesse de outras pessoas.
No caminho encontra pessoas dispostas a ajudar e que possibilitou uma primeira aula para cerca de 13 moradores do Morro dos Prazeres, com o nome “Bem Vindo à Web 3.0”. A partir daí passa a disparar conteúdo informativo pelo Whatsapp para as pessoas interessadas.
SUBINDO O MORRO DIGITAL
Uma mensagem despretensiosa do artista do grafite, Beco Pro, vizinho de São Gonçalo, encarada sem “muita fé” inicialmente por Igor, alçou o projeto para outro patamar. Ele colocou à disposição do Favelaverso um espaço no metaverso para desenvolver as atividades sonhadas.
Em conjunto com outra parceira, eles formam o Favela DAO, para dar transparência e facilitar o financiamento do projeto. Com o resultado, já conseguiram realizar duas edições do Baile de Favela no metaverso e querem organizar outro evento até o fim do ano.
Para além do mundo digital, o avanço da pobreza e da fome urgem respostas imediatas, e Igor não quer passar alheio à estes problemas. Ele adianta que a arrecadação das próximas vendas vão ser destinadas a uma festa de natal na comunidade.
“É mais que uma proposta educacional, mas queremos ajudar de verdade, de forma assistencial. Esse retorno positivo que nós queríamos que fosse desde o início”, justificou.
Para 2023, Igor quer que o Favelaverso ofereça aulas introdutivas sobre web 3.0 e metaverso, e também construir um espaço no Morro dos Prazeres com computadores para capacitar os jovens a trabalharem no mundo digital.